A cervicalgia, ou dor cervical, é a quarta principal causa de incapacidade. As mulheres relatam dor no pescoço com mais frequência do que os homens e as causas da dor cervical variam amplamente, sendo as principais causas posição inadequada no trabalho e manter a postura do pescoço em uma posição não fisiológica por longos períodos de tempo. As características do local de trabalho, como as demandas percebidas do trabalho, o desequilíbrio esforço-recompensa e o apoio dos colegas de trabalho foram todos fatores de risco significativos, estresse, angústia, ansiedade, problemas de sono, depressão, mudanças de humor e emoções, funcionamento cognitivo e comportamentos relacionados à dor foram considerados fatores importantes no desenvolvimento da dor no pescoço.
A duração dos sintomas pode classificar a dor cervical como aguda em menos de 6 semanas, subaguda em 3 meses ou menos ou crônica em mais de 6 meses. Existe uma associação entre menor duração da dor cervical e melhor prognóstico para desfechos em longo prazo. A dor cervical aguda desaparece em grande parte dentro de 2 meses a partir do episódio inicial de dor, mas uma proporção significativa de pacientes continua a ter recorrência da dor cervical ou algum desconforto em 1 ano. O melhor preditor de dor cervical futura é a presença de um episódio de dor cervical no passado. Fatores associados à cronicidade da cervicalgia incluem psicopatologia, baixa satisfação no trabalho, sedentarismo, dores de cabeça, sexo feminino e ambiente físico de trabalho e ergonomia ruins.
Classificação
A cervicalgia não traumática pode ser classificada de acordo com o gerador suspeito de dor. Pode ter um componente mecânico (disco intervertebral cervical, articulações cervicais zigapofílicas, articulações facetárias, ligamentos e articulações atlantoaxiais), ou um componente neuropático (radiculopatia secundária à compressão ou irritação do nervo espinhal secundária a uma hérnia de disco, estenose foraminal, ou estenose espinhal central), ou uma combinação de ambos. A entidade controversa da síndrome dolorosa de causa músculo-fascial é uma condição que provavelmente engloba dores cervicais não explicadas pelos achados de imagem, de forma crônica.
A dor cervical com déficit neurológico pode ser causada por hérnia de disco com compressão da raiz nervosa, estenose foraminal grave ou complexo disco-osteófito que leva à compressão da raiz nervosa ou estenose central que leva à compressão da medula e mielopatia. A ossificação do ligamento longitudinal posterior é uma condição única que pode causar compressão medular e mielopatia. A mielopatia é um diagnóstico clínico. Frequentemente refere-se a fraqueza, equilíbrio e déficits motores finos secundários à compressão da medula espinhal.
O diagnóstico diferencial da cervicalgia é amplo e devem ser descartadas outras múltiplas etiologias: doença arterial coronariana, infecção (osteomielite, discite, abscesso retrofaríngeo, meningite, fratura do dente), malignidade (mieloma múltiplo, metástase), condições reumatológicas (polimialgia reumática, fibromialgia), etiologias vasculares (dissecção vértebra ou carotídea) e síndrome do desfiladeiro torácico para dor no pescoço associada a sintomas no braço. Embora raras, as condições de dor no pescoço associadas a sinais de alerta (mielopatia, osteomielite, discite, incontinência intestinal ou vesical, suspeita de malignidade) precisam ser tratadas rápidamente e geralmente requerem imagens avançadas (ressonância magnética ou tomografia computadorizada), juntamente com trabalho laboratorial específico (velocidade de hemossedimentação, proteína C reativa, hemograma completo, etc).
Clínica
A história e o exame físico desempenham um papel fundamental na exclusão de algumas das causas mais graves de dor no pescoço que requerem intervenção médica. A diferenciação entre várias condições dolorosas envolvendo o pescoço é menos crítica, especialmente se os sintomas se resolverem com o tempo e o tratamento conservador. Qualquer trauma significativo na cabeça ou pescoço que resulte em dor intensa deve ser avaliado.
A observação da posição do pescoço e da cabeça e a amplitude de movimento fazem parte do exame físico. Deve-se pedir ao paciente que indique onde a dor é percebida, nomeie os fatores agravantes e atenuantes, descreva o caráter da dor (lancinante, aguda, elétrica, irradiante versus não irradiante), e se a dor está interferindo no sono, no trabalho e nas atividades da vida diária. Quaisquer posições para aliviar a dor do pescoço, juntamente com restrições na amplitude de movimentos ativa e passiva, devem ser observadas.
Os déficits de rotação cervical são observados principalmente em problemas da coluna cervical superior, como na patologia da articulação atlanto-axial (entre as duas primeiras vértebras cervicais). A dor que irradia para o occipital deriva geralmente da patologia cervical C1 a C3. A patologia da coluna cervical inferior pode se manifestar com dor axial, que é dor de característica em pontada, geralmente associada a mobilização (hérnias de disco, dor discogênica, formação de osteófitos laterais). A dor neuropática (dor radicular) afeta mais frequentemente as raízes nervosas C6 e C7 como resultado de patologia nos níveis vertebrais C5 a C6 e C6 a C7.
Diagnóstico
Em pacientes com trauma na cabeça ou pescoço, as radiografias da coluna cervical tanto em flexão como em extensão podem determinar instabilidade (mais de 3 mm de diferença no alinhamento entre flexão e extensão) em alguns segmentos da coluna cervical.
A TC da coluna cervical raramente é indicada na ausência de trauma e ausência de cirurgia prévia na região do pescoço. A ressonância magnética é a modalidade de imagem mais sensível para estruturas de tecidos moles (medula espinhal, disco intervertebral, cistos sinoviais) e fraturas subagudas. A ressonância magnética deve ser considerada em pacientes com alterações neurológicas progressivas e para avaliação pré-cirúrgica ou pré-procedimento.
Os estudos eletrodiagnósticos constituem uma extensão do exame físico e devem ser usados se houver falta de correlação entre o exame físico e a ressonância magnética e diferenciar entre radiculopatia cervical, aprisionamento de nervo periférico no membro superior (neuropatia) e plexopatia braquial. Em casos de fraqueza em qualquer distribuição um fisiatra ou neurologista com habilidades em eletrodiagnóstico deve ser consultado.
Tratamento
Os tratamentos mais simples para a dor cervical axial incluem modificações no estilo de vida e nas atividades. Parar de fumar e evitar atividades que sobrecarreguem o pescoço (extensão ou flexão excessiva), são as primeiras opções de tratamento. Existem algumas evidências da eficácia da fisioterapia ativa combinada com a educação do paciente, focando em um rápido retorno à função normal para ajudar a aliviar a dor cervical axial.
O uso de injeções com corticoides no espaço interlaminar-epidural tem se mostrado extremamente eficaz, com alívio de curto prazo na grande maioria dos pacientes. As injeções transforaminais são ligeiramente menos eficazes, embora ainda produzam alívio positivo de curto e longo prazo em mais de 60% dos pacientes. Um bloqueio diretamente no nervo, que funciona anestesiando a inervação das articulações, é frequentemente administrado se houver suspeita de que a dor se origine nessas articulações. A melhora dos sintomas após o bloqueio também é indicativo de que a ablação por radiofrequência provavelmente será eficaz. Esta técnica é realizada colocando um eletrodo percutaneamente contra os nervos que inervam a articulação dolorida. Esses eletrodos são então aquecidos a 80 °C para produzir lesões nos nervos e prevenir a transmissão da dor.
As opções cirúrgicas mais invasivas para o tratamento da dor cervical axial incluem fusão cervical e artroplastia cervical. Na discectomia cervical anterior e fusão, o disco cervical é removido em uma abordagem anterior, sendo substituído por um enxerto ósseo e as vértebras adjacentes são fusionadas. A artroplastia é semelhante à discectomia anterior, exceto que não há fusão da coluna vertebral, mas sim a substituição do disco com um implante. As vantagens dessa técnica são a manutenção da flexibilidade e da amplitude de movimento após a cirurgia e um benefício teórico de menos degeneração em nível adjacente.
Nos casos de radiculopatia cervical a recuperação espontânea tem sido relatada, e é mais provável que ocorra no caso de uma hérnia de disco, porque a maioria das hérnias de disco cervicais podem melhorar com o tempo. No começo dos sintomas, a primeira linha de tratamento é feita com analgésicos, como agentes antiinflamatórios não esteroides, que são eficazes no tratamento da dor no quadro de radiculopatia aguda. Nesse ponto, a interrupção das atividades que possam piorar os sintomas é muito importante.
Tratamentos farmacológicos como relaxantes musculares, analgésicos narcóticos (opiáceos e opióides), e corticosteroides são frequentemente prescritos e apresentam bons efeitos no curto prazo sobre a dor. As injeções no espaço epidural de corticosteroides de forma translaminar ou transforaminal também mostraram taxas de sucesso em longo prazo de 40% a 70%.
A fisioterapia com exercícios de amplitude de movimento, condicionamento aeróbico e exercícios de resistência também têm mostrado benefícios no tratamento da radiculopatia cervical.
Os tratamentos cirúrgicos são geralmente indicados quando os tratamentos não operatórios não produziram melhorias perceptíveis após pelo menos 3 meses. Três tratamentos cirúrgicos são recomendados para radiculopatia cervical: discectomia cervical anterior e fusão, artroplastia e foraminotomia posterior.